sábado, 23 de fevereiro de 2013

O Paulo, o João e eu.



Esta semana participei do programa de entrevistas “Meia Hora” com João Alexandre na Koinonia on line, um momento especial pra mim, depois de um programa muito agradável, ainda tive a grata surpresa de conhecer o Paulo César (Logos) no final.

O João e o Paulo fizeram parte da minha iniciação musical. O João pela sua história como cantor e compositor, seja na carreira solo ou com o grupo Pescador, ou Milad, ou VPC. O Paulo por tudo que fez com o Elo e depois com o Logos.

A música é uma linguagem universal, sons e palavras nos emocionam e marcam momentos da nossa vida. Quando ouço antigas canções me sinto transportado no tempo. A canção me faz lembrar de onde eu estava quando a ouvi, traz de volta os sentimentos que na época sentia, as pessoas que estavam ao meu redor, a canção traz de volta os mesmos sonhos da época, a mesma inocência juvenil, o cheiro do local e a emoção que impulsionava o coração.

Nenhuma lembrança que guardo da vida na memória pode ser tão bem revisitada como no momento em que ouço a trilha sonora que a embalou. Pra mim, a música encurta o tempo que passou tornando-nos jovens de novo, nos inspira a mergulhar no sonho do seu universo como faz uma criança, e eterniza momentos do coração como se fôssemos imortais. É uma dádiva de Deus ao homem. A melodia, a harmonia e o ritmo estão em todos os cantos da natureza, a poesia está no coração e na boca do homem e a inspiração está no seu íntimo onde o Espírito de Deus o ensina.

Encontrar esses dois caras me fez viajar no tempo como um Marty McFly na máquina de Emmett Brown em “De volta para o Futuro” do século 21. Foi como encontrar pela primeira vez pessoas íntimas que viveram comigo toda a adolescência e juventude através do meu velho Stereo System CCE.

Cada LP de VPC, MIlad, Elo, Logos, Som Maior, cada composição do João, do Paulo, do Guilherme Kerr, do Bomilcar, do Sérgio Pimenta, do Janires, cada entonação da voz de cada um deles, do Jorge Camargo, da Cíntia e da Sílvia, enfim, todo este universo, fez parte da atmosfera do meu crescimento.

Se eu sou saudosista? Quem não é?
O moderno pra mim hoje, será saudade pra mim amanhã. Como bem escreveu Belchior, e muito bem cantou Elis:

“Nossos ídolos ainda são os mesmos
E as aparências não enganam não
Você diz que depois deles não apareceu mais ninguém”

É assim que eu sinto.

Tem muita gente fazendo muita coisa boa na música hoje. Tem muita gente compondo ainda com poesia e consciência, mesmo no nosso universo musical tão carente de reflexão e teologia. Esses heróis da resistência com certeza fazem parte de uma linhagem nascida talvez na sinceridade e temor do rei Davi, e que passou por estes meus mestres, destacando que ainda estão na ativa e bem ativos. Agora me sinto desafiado e por eles encorajado a fazer parte dessa gente. Gente boa de coração. Deus me ajude todo dia.

Alguém pode pensar que eu seja contra toda e qualquer manifestação musical dos dias de hoje, absolutamente não. Eu me sinto um garimpeiro na margem do rio procurando brincos para os ouvidos e não só para as orelhas, e tenho ouvido muita coisa legal, mas eu não sou crítico, apenas observador.

Não sou o saudosista que se fecha para o mundo de hoje, só não quero ser de um mundo hoje que não tem saudade de sua bela história. A história me faz entender de onde foi que eu vim, me faz ver os acertos do passado pra que eu seja sábio em reproduzi-los, e me aponta os erros cometidos pra que eu nunca os repita.

Esses personagens da minha história me ensinaram muito à distância, e hoje, aos poucos, a história corre no tempo e me alcança pra minha cura. Pensava eu que havia perdido muito tempo, mas “se penso, logo existo”, então ainda vivo pra pensar tudo de novo. Que bom.

Agradeço a vida por estas oportunidades, e agradeço a Deus pela graça que me deu a vida.

Confira - http://www.koinoniaonline.net/meiahora/meiahora_19.htm

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Ainda há tempo



"Os meus pais sempre pareceram ter a mesma idade, sempre os olhei e aparentavam ser imutáveis até que de repente, não sei por que, notei que envelheceram."

"Os meus filhos sempre pareceram pequenos sempre com o mesmo jeitinho infantil e indefeso, até que de repente, não sei como, percebi que cresceram."

"Sempre me senti o mesmo, do mesmo jeito, imutável, insistentemente jovem até que de repente, numa investida esportiva qualquer, percebi que o tempo tinha me feito mais velho."

Essas frases fazem parte do nosso envelhecimento, e as ouvimos sempre. Engraçado, o tempo e sua relatividade.

Isso me fez pensar que só começo a perceber o efeito do tempo no dia em que começo a ter consideração pelo que me cerca.
Não sou filósofo, e sei que nem tudo acontece da mesma forma pra todo mundo, mas no meu caso que vivi uma história de correria desvairada, de trabalho insano, foi bem assim. Coisas e pessoas pareciam não envelhecer porque eu não me importava com elas, simplesmente não faziam parte das minhas preocupações, quando percebi que realmente eram importantes, elas simplesmente se foram.
Eu penso que enquanto aquilo que eu vejo não fizer parte do meu mundo, não fizer parte dos meus interesses, sempre me parecerá imutável, falsamente eterno, até eu mesmo.

Corremos como loucos pra ter muito na vida e perdemos o melhor da vida que deveria ser muito pra nós.

Eu pensei: “Me preocupo com todas as coisas que sempre existirão e sempre terei tempo pra elas, enquanto as que realmente importam passam sem que eu perceba.”

Isso é verdade, você se preocupa com o comércio que sempre estará aí, com a sua profissão que existia antes de você e continuará a existir depois da sua partida. Você se preocupa com o dinheiro que sempre existiu e sempre existirá. Você se preocupa com a sua carreira, com o consumo, com a ilusão das coisas que nunca deixarão de existir, você sempre terá tempo pra elas, enquanto aquelas que passam, e nunca mais voltarão, ficam congeladas no tempo do universo do seu desprezo.

Aquilo que não me importa, parece que sempre estará lá, imutável, do mesmo jeito, quando enfim acordo e vejo que é importante, e descubro que posso perdê-lo, aí então parece que o tempo decide correr da noite para o dia tudo que não correu antes. Pura ilusão temporal. São os fantasmas da aceleração do tempo que me atormentam, e trazem com eles a tristeza de ter passado por tudo que não percebi que vivi. Parece que pra compensar o tempo do descaso que vivi, o próprio tempo acelera e passa rápido me punindo, pois agora decidi me importar.
O tempo vai passar sempre, é impossível detê-lo, pena que só percebo que passou, quando se foi. Todas as coisas na nossa vida passarão, podemos escolher se queremos passar cada segundo com elas ou apenas perdê-las da noite para o dia como se passassem num piscar de olhos. A vida passa e precisamos passar por ela junto das coisas que Deus nos deu, e que realmente importam.

Bom é passar o tempo passando por tudo que o tempo me dá a dádiva de passar. Bom é passar o tempo cuidando de tudo que Deus me dá a dádiva de cuidar, meu lar, minha família, meus filhos, meu ministério, e inclusive de mim mesmo.

Só tenho hoje pra viver o hoje. Mesmo que eu não perceba, já vivi o ontem, e se não acordar, nem vou notar quando viver o amanhã.

Nunca seremos mais nem menos por ter o que mundo diz que precisamos ter, mas seremos com certeza mais felizes se vivermos a vida da maneira que Deus desejou que vivêssemos.
Nunca permita que o tempo passe sem que você perceba que ele está passando pra tudo que é importante pra você, sem que você passe tudo que Deus te deu junto com ele. 

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Pensando na fé



Jesus nos ensinou a não andarmos ansiosos. A inquietação nos consome. Acredito que este seja um dos maiores desafios do cristão, ter fé. Não sei se você pensa como eu, mas acho que a fé em Deus pode livrar uma pessoa da ansiedade, e se a fé nos livra da ansiedade, não é maluco pensar que há pessoas vivendo uma fé que as deixa ansiosas na espera do que Deus vai fazer?
Sempre achamos que fé é acreditar em algo impossível, e é verdade, isso também é fé, mas eu penso que a fé é algo muito maior do que acreditar que posso receber o que quero, ou acreditar que Deus vai me dar o que preciso. Pra mim fé também é descansar e acreditar que posso viver sem o que acho que preciso, pois Deus cuida de mim.

É engraçado, temos fé pra que Deus nos dê o que precisamos, mas não temos fé pra crer que podemos viver sem o que pensamos que precisamos...

Eu pergunto - Fé é acreditar que Deus pode me dar o dinheiro que preciso, ou acreditar que Deus pode me fazer vencer sem o dinheiro que acho que preciso?

Quando lemos na Bíblia que o justo viverá pela fé ficamos incentivados a continuar crendo, pois é assim que o justo vive, mas cabe a pergunta:
Crendo em que?
O justo viverá pela fé em Deus e nos planos de Deus e não nos seus próprios. Esse é o nosso desafio, crer que Deus é bom e faz coisas boas, se isso é verdade, então o que eu estou vivendo não deve ser ruim, deve ter um bom final, pois Deus só faz coisas boas.

Fé é também o nosso jeito de viver. Dependemos de Deus, obedecemos a Deus, aceitamos o modo de vida que o evangelho nos propõe. Desejamos ter o fruto do Espírito em nossas atitudes. Fé é saber que posso viver do jeito que Deus quer, sem tomar caminhos alternativos, na certeza que minha felicidade estará aí.

Tem gente que tem fé pra receber o que quer de Deus, mas não tem fé pra fazer o que Deus quer que façam.

Ser um cristão de sucesso nos dias de hoje é ter o poder através da fé de fazer Deus realizar tudo que se deseja, como se Deus fosse uma máquina a favor da vontade do homem e a fé fosse a chave que liga essa máquina. Quem pensa assim se esquece de que Deus tem vontade e propósito, em também se esquece de que Deus é senhor e nós somos servos.

Há muita gente frustrada, pulando de religião em religião tentando achar qual é o método religioso que faz Deus funcionar a seu favor. Não distante disso, há muita gente pulando de igreja em igreja tentando achar qual é a igreja mais poderosa pra fazer Deus lhe obedecer. A propaganda mostra gente feliz com carros na garagem, promoções no trabalho e conquistas indiscutíveis que fazem daquela instituição o lugar certo onde Deus responde a tudo e a todos, e é ela que você deve escolher. Acho que não é isso...

Na aflição busco a Deus. Na angústia clamo ao Senhor. Na dor me refugio no altíssimo. Na dúvida espero sua direção. Só quem já sofreu sabe o valor da fé. Nunca deixe de crer em Deus, mas faça de sua fé um ato de dependência e confiança nunca um ato de cobrança ou de autoritarismo.

Devo crer que Deus pode me socorrer? Claro que sim
Devo crer que Deus pode curar alguém? É óbvio que sim
Devo ter fé que minha vida será uma vida feliz com Deus? Lógico que sim.
O que não posso é achar que a minha fé transformará Deus num ser obediente à minha vontade.

Nunca deixe de crer que Deus se fará presente em suas dificuldades, nunca deixe de crer que Deus pode fazer milagres em responder suas orações, mas nunca esqueça que o Deus Pai sabe tudo que precisamos, e que uma resposta diferente do que você pensou, não implica num resultado diferente do que o que você necessita.

Penso que Deus sempre fará o que preciso, mas nem sempre o que quero, pois nem sempre o que quero é o que realmente preciso.

A resposta de Deus pode ser contrária ao que pensei, mas o propósito de Deus nunca será contrário à minha felicidade.

Hoje, uma religiosidade mesquinha e materialista, que aponta conquistas e prosperidade como o único sinal da presença de Deus, o que se prega é que a fé é uma chave pra fazer Deus servir ao homem, mas na verdade a fé é uma convicção que leva o homem a servir a Deus.

Pense um pouco na sua fé.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

O Milton Nascimento não pensava em nós


Assisti ao programa “On The Record” do canal Bis com John Mayer, um programa de entrevistas apresentado por Touré Neblett.

Gosto do John Mayer como guitarrista e bluesman, ele me faz às vezes pensar que estou ouvindo um blues pop e clássico texano ao mesmo tempo, e com requintes de Stevie Ray Vaughan. A carreira Pop de John Mayer não me agrada muito, mas isso é apenas a minha opinião, o cara é uma celebridade, deve estar certo e eu errado seguramente. Que bom que não sou o dono da verdade, o mundo fica bem melhor assim...rsrsrs

Voltando ao assunto, gosto muito de ouvir compositores falando sobre suas inspirações, gente que compõe falando no que pensava enquanto compunha, ou o que pensava antes de compor. Gosto muito de filosofar sobre o acaso que levou o poeta a descobrir sabedoria e transformá-la em arte digerível para a comunidade de admiradores. Gosto da contribuição que o compositor dá à humanidade através dos devaneios de sua reflexão. Gosto de gente que compõe e fala com as minhas emoções e com a minha razão ao mesmo tempo. Gosto de gente que sente o que fala, tanto quanto pensa antes de falar. Pra mim, a inteligência de quem escreve, é tão importante quanto a emoção contida no que escreveu. Pra dizer a verdade só me emociono com o que entendo. Recomendo este programa com John Mayer e o programa com David Gray, outro compositor e cantor britânico que admiro.

Não sou o tipo de cara que procura sons, tons ou palavras que o povo goste de ouvir, estou sempre à procura de melodias e palavras que possam expressar o que eu quero falar, independente de quem vá ouvir.

Nesta entrevista, John Mayer disse algo com o qual me identifiquei. Touré perguntou se a vida e as coisas que o rodeavam, faziam parte do seu universo inspirador, John Mayer disse que sua humanidade, seus erros e acertos, enfim, tudo, fazia parte de seu universo de inspiração, tudo vem da observação e do coração, disse ele: “Se você fechar o seu coração, você não será mais capaz de fazer música, apenas fazer gravações”.

Achei isso fantástico!

Nossa música cristã está amparada por um sem número de congressos que ensinam “adoradores” a “adorar”, que ensinam líderes de louvor a levar o povo a louvar. Não sou contra isso, absolutamente, tudo é necessário, mas sinto falta da filosofia da coisa. Temos uma prateleira cheia de opções musicais pra nossa Igreja cantar no domingo, são milhares, ou milhões de CDs lançados todos os meses, e sinto falta de algo que me soe novo.

Alguém faz uma música sobre “Estar apaixonado por Jesus”, não faço juízo de valor, julgo ter sido uma experiência genuína individual de alguém, mas porque fez sucesso, o Brasil é invadido por uma avalanche de músicas sobre estar apaixonado. Uma música sobre a Chuva de Deus faz sucesso, de repente, é enchente de Manaus a João pessoa, de Brasília a Porto Alegre, toda Igreja grava um DVD sobre a chuva. Uma música sobre Restituição, e todos os compositores do Brasil recebem a mesma inspiração no dia seguinte.

Estamos em busca da inspiração perdida ou da fórmula do sucesso?

O sucesso não é pecado, mas ele vem depois da arte feita, não é produzido por antecipação.
Quero ser Lennon/McCartney, e não Fernando/Sorocaba. Nada contra o sertanejo nem contra dupla em questão, apenas nomes que me vieram à mente, mas quero ser inspirado pelo que me faz sentir, entender e viver, e não inspirado pelo sucesso de alguém pra ter o que o “bem sucedido” tem.

No mundo inteiro há compositores tentando achar a fórmula do sucesso, o elixir da aceitação pública, o caminho místico que leva ao Grammy, cada dia uma tentativa nova acontece. O pior é que dá certo, o povo gosta!!!

Lererê Lererê, é o tchan, eu quero tchum eu quero tchá, tchêtchererêtchetche fulano de tal e você!
Eu entendo...todos querem dar certo...vá lá...normal.

Meu consolo matemático é que por mais longeva que seja a manifestação, um dia o limite estatístico das combinações possíveis do alfabeto ocidental colocará um ponto final nessa onomatopeia. É a redenção que espero. Se não viver pra isso, pelo menos usei e abusei da liberdade de escolha individual do ser humano.

Eu sei o que você vai me dizer, o mundo musical não existe pra mim, a música é de todos, eu sei, é apenas o meu direito de falar e ouvir. Quem mandou acessar este blog...rsrsrsrs

Não estou dizendo que sou bom, ou certo, e o resto errado, ou ruim, apenas aqui quero revelar como penso e sinto, e de alguma forma compartilhar com alguns, o que julgo ser importante. Não sou o dono da verdade, ao contrário do rei Roberto, esse cara não sou eu!

É comum ver na terra gente que tenta achar a fórmula, é normal acontecer com quem só quer a fama, tudo bem...mas não conosco! Não com a gente, não com quem tem uma contracultura, não com quem tem o evangelho, não com quem deve apresentar a Deus um culto racional, não com quem deveria pensar pra falar e sentir pra compor. Não podemos nos auto-plagiar, não estamos procurando o que dá certo, já temos o que dá certo, precisamos desenvolver a nossa arte.

Não sou contra o mercado, nem contra o sucesso, nem contra o comércio, eles são amorais, imoral é o homem, é quem se move neles, e do jeito que se move neles.

“Se você fechar o seu coração, você não será mais capaz de fazer música, apenas fazer gravações”.

Penso que temos muitas gravações.
Penso que tem muita gente gravando e poucos compondo.
Penso que o mundo não sabe, mas espera pelo que temos a dizer.
Penso que temos muito a dizer
Penso que temos que pensar antes de dizer
Penso que temos preguiça de pensar
Não quero pensar que somos incapazes de pensar
Penso, logo existo.
Se penso mal sou uma aberração da existência
Mas se penso bem, penso que pode existir uma saída pra nós.

Certas canções que ouço
Cabem tão dentro de mim
Que perguntar carece
Como não fui eu que fiz
Certa emoção me alcança
Corta minha alma sem dor
Certas canções me chegam
Como se fosse o amor
Contos da água e do fogo
Cacos de vidas no chão
Cartas do sonho do povo
E o coração do cantor

Vida e mais vida ou ferida
Chuva, outono ou mar
Carvão e giz abrigo
Gesto molhado no olhar

Calor invade arde queima
Encoraja amor
Invade arde carece de
Cantar amor . . .

- Cê tava cantando pra gente Milton?...Tava pensando em nós?...Não?...Que pena...

domingo, 3 de fevereiro de 2013

Lembra do skate Bandeirante?

Nunca estou em casa aos domingos de manhã, mas hoje, devido ao meu repouso pós-operatório (meu ombro tá novinho agora), aqui estou eu assistindo o mundial de Skate Vertical. Eu me lembro de quando o esporte surgiu, os primeiros skates chegavam ao Brasil... faz tempo... eu era adolescente e a Reportagem do Fantástico falava em surf com rodas!
Meu primo Zé ganhou um Skate e eu fiquei vidrado. A onda eram os Skates Torlay, quem tinha um era o cara. No Brasil a Bandeirante, fábrica de triciclos e tico-ticos, fazia um skate tupiniquim que era o nosso sonho de consumo, eu e o Jorge chegamos a ter um usado, que alegria, um skate Bandeirante...era nacional, mas e daí?
Eram os primeiros passos de uma diversão de garotos que se transformaria num esporte de alta performance com um circuito mundial badaladíssimo.

Eu nunca fui skatista, não foi o meu esporte, mas nessa manhã fiquei paralisado diante da TV, eu estava diante de uma cena rara. Se os repórteres não dissessem nada, ninguém imaginaria que aqueles meninos, colegas de skate são na verdade atletas alta performance. O cenário não é um cenário de competição de alta performance.

Esportes que exigem alta performance dos atletas são esportes incríveis, plasticamente lindos de se ver e chatíssimos de se viver. Atletas de alta performance precisam de psicólogos pois há muita cobrança. Treinos estressantes, técnicos estressantes, reportagens estressantes de uma imprensa estressante que cobra mais que a torcida. Uma torcida estressante, apaixonada e doente, que por amor ao esporte se torna violenta!
Patrocinadores querem resultados, a imprensa se mete até na vida pessoal dos atletas. Muito dinheiro envolvido, cada atleta precisa se preocupar com seu rendimento, seu contrato, sua imagem, sua rentabilidade. Empresários pensam em suas carreiras e ganham milhões com esses atletas. Talvez um atleta assim, sem perceber, destrua o próprio sistema nervoso e a autoestima em busca de felicidade, um contra senso. Torcedores se matam, e o país passa a odiar aqueles que perderam um pênalti, ou não conquistaram uma medalha, e por fim estragaram a vida da nação!
Pior ainda se o adversário for argentino, meu Deus, isso aumenta nossa vergonha e tira de nós o direito de fazermos piadas demonstrando ser uma raça superior aos outros seres humanos que vivem num limite territorial distinto.
Somos Hitler tentando provar a superioridade da raça ariana diante da incontestável superioridade de Jesse Owens, um negro que apenas corria por esporte, mas carregava sobre si a responsabilidade de demonstrar que os arianos seriam subjugados pelo Black Power. Humanos se autodestruindo emocionalmente pra recuperarem as perdas da vida subjugando outros seres humanos através do esporte. Que beleza!

Era pra ser só um esporte!

Os garotos do Skate me pareceram tão distantes disso... A área dos atletas era um pequeno espaço onde todos conviviam juntos, aliás eles se conhecem! Parecem até que torcem uns pelos outros. Eles se cumprimentam a cada volta, vibram uns com os outros, e lamentam quando vêm um adversário errando uma manobra, parece que amam as manobras, amam ver os twists, os “360º.”, os saltos radicais uns dos outros. O atleta que falha e cai, lamenta, dá risada e é aplaudido por uma multidão de garotos também skatistas que vibram a cada manobra, tudo ao som de um bom, e velho Rock. O comentarista Sandro Dias, também skatista, se delicia com cada um de seus amigos que competem. Pais e mães dos competidores incentivam e acompanham seus filhos, ninguém é mais, ninguém é menos, ninguém é superior e ninguém é careta.
Do estúdio, Ivan Moré pergunta a Tiago Leifert que está ao vivo na rampa, se há animosidade ou rincha entre os skatistas e Tiago diz que absolutamente não, então a câmera mostra a brincadeira entre eles e sua amizade.

Nomes de rapazes talvez desconhecidos do universo da maioria de nós telespectadores, como Rony Gomes, Mitchie Brusco, americano de 15 anos, Pedro Barros, Bob Burnquist, Andy Mcdonald, Jimmy Wilkins ou Marcelo Bastos me inspiraram e acho que me confirmaram uma lição – É preciso saber viver.

Enquanto isso alguns canais vizinhos no mesmo instante, e ao longo da semana, transmitem o evangelho de alta performance. Pessoas são ensinadas a se desgastarem pra serem felizes. É a fé de alta performance, fé de maior rendimento. Frases como: “Creia mais, se sacrifique mais, doe mais. Tome posse do que quer, não aceite a derrota, oferte 10% dos 100 que você quer ganhar, profetize vitória a todo tempo, faça vigília, suba no monte, desça no vale, faça Deus ficar te devendo!!! Você só será feliz quando Deus fizer o que você quer!”

Uma fé de alta performance faz Deus melhorar sua performance. Entendeu?

“Esfregue mais a lâmpada e o gênio da lâmpada te permitirá 3 pedidos, talvez 12 se ele estiver de bom humor, ou 11 se ele te cobrar o pecado de Judas...”novesfora”... você ainda estará no lucro.”

Meu Deus, que saudade do skate Bandeirante...

A Igreja da TV se tornou um bom motivo pra selecionar canais de qualquer outra coisa nos “preferidos” do controle remoto.
Esses garotos me disseram que a vida é bela. Que tudo que Deus fez é bom. Somos humanos, somos irmãos, somos criaturas de Deus.
O que estamos fazendo com o mundo que Ele nos deu? O que estamos fazendo com a diversão? O que estamos fazendo com o esporte?
Ciclismo, um sinônimo de saúde, agora faz atletas se encherem de anabolizantes e drogas, perdendo a saúde pra ganhar mais dinheiro? Que loucura!!!

E mais - O que estamos fazendo da fé? Virou uma corrida? O prazer de celebrar a Deus se transformou num caos? A alegria de viver com Deus deu lugar a odiar a Deus por não nos dar a vida que queremos ter longe dele?? Quem é mais ungido? Quem tem mais poder? Quem faz mais milagres? Qual Igreja dá mais rentabilidade de bênçãos em troca da sua fé?
Alta performance...que loucura!!

Não sei se o cenário do circuito mundial de Skate é o paraíso, talvez não seja, tive apenas uma impressão hoje, mas agradeço a Deus pelo que vi. Adultos ou não, atletas ou não, o que importa é que vi crianças se divertindo.

Todos os skatistas têm patrocínio, roupas, viagens e altos salários, mas me deram a impressão de que sempre serão felizes por apenas ter uma rampa pra curtir mais uma volta, aliás, me deram a impressão de que já eram felizes antes do profissionalismo, curtindo o skate nas praças onde de forma precária e interesseira o poder público ainda mantém rampas mal conservadas.

Bem aventurado o que precisa de pouco pra ser feliz. Mais bem aventurado ainda o que percebe que Jesus é tudo, e infinitamente mais do que o nosso pouco ou o nosso muito.
Triste ver que aquele ambiente juvenil deveria ser achado no seio da Igreja, mas sei que em muitas Igrejas ele ainda é achado, porém as que aderiram ao caminho da mídia parecem andar em outro sentido.

Ainda bem que Deus não precisa das instituições “Igreja” pra dar alegria de viver a um garoto.
De alguma forma, o que estas instituições não conseguem promover dentro de quatro paredes, eles encontraram sobre quatro rodas.

Num mundo capitalista, competitivo e de alta performance, esses garotos encontraram vida, quero falar pra eles do evangelho da salvação. Quero falar pra eles do Pai que criou tudo, do Filho que nos salva e do Espírito que habita em nós. Quero que eles continuem a me ensinar a ser simples.
Quero ser parte de uma Igreja que vive a vida de Deus em comunhão, e que quer ensinar e levar essa vida aos homens.

Acho que esses garotos são o tipo de gente que precisamos ser, são os missionários urbanos que precisamos ser pra demonstrar a vida de Deus ao mundo, e são a campainha que deve nos acordar todos os dias.

Vou comprar um skate Bandeirante, tipo peça de museu mesmo, e colocar na parede do meu estúdio pra nunca me esquecer do que vi hoje.

Bem que a Bandeirante poderia voltar a fabricar esses modelos, eu confesso que desejaria ser um representante comercial só pra distribuir skates na Rua Conde de Sarzedas... bom, acho melhor não...eu morreria de fome...